Resistência e sustentabilidade na Caatinga
Seguindo na contramão dos séculos que engessaram o sistema produtivo nacional com modelos baseados na concentração de terras, na monocultura e voltados à exportação, vivem as comunidades de fundo de pasto na Caatinga. Estas se caracterizam pela posse e uso comunitário da terra e dos seus recursos. Costuma-se afirmar que nestes espaços o bode é o rei. Isto porque, no fundo de pasto, os animais são criados livremente, sendo reconhecidos por algumas marcas feitas pelos seus donos. Tal modelo de criação facilita o acesso dos animais à água e à comida, principalmente nos períodos de estiagem severa, além de ser um exemplo de adaptação e convivência com o clima semiárido da região.
As poucas cercas existentes nestas localidades não denotam, necessariamente, propriedade privada, apenas protegem os lotes de plantação e os pequenos animais, como as galinhas, de outros maiores, criados extensivamente. A produção é prioritariamente para consumo das famílias produtoras e tocada por homens e mulheres que mantém fortes vínculos com as tradições locais e com o manejo ambiental sustentável do território. Bons conhecedores do seu habitat, sabem que após os períodos de seca, as plantas voltam a florescer, que os animais podem encontrar os alimentos que necessitam e que a água comunalmente dividida e racionada garante uma qualidade de vida digna a todos.
Os fundos de pasto se constituem em centenas de comunidades espalhadas pela Caatinga e são considerados pelos órgãos oficiais do Brasil como populações tradicionais. Estas se caracterizam como grupamentos humanos marcados por identidades e valores comuns. Os traços étnicos e raciais e suas trajetórias de vida são os mais diversos, isto porque existem fundos de pasto quilombolas, indígenas ou de agricultores e agriculturas familiares que nasceram e cresceram naquelas localidades, se ocupando de plantações ou cuidando de seus animais, em geral caprinos e bovinos.
A aridez do ambiente não é o principal desafio destas populações. As investidas de grileiros, dos pecuaristas e do agronegócio que tentam adentrar os territórios comunais dos fundos de pasto se apresentam como as principais ameaças às comunidades. Os habitantes destas, na sua maioria, não possuem títulos de posse das propriedades, o que é utilizado como argumento para as tentativas de tomada das terras. Em diversos estados, brotam histórias de resistência de homens e mulheres para permanecer nas suas casas, nas suas terras, com seus animais e plantações. E mais, resistem de forma organizada, através de associações, para existir em comunidade e para terem sua identidade respeitada.
Fonte: Ocareté